terça-feira, dezembro 3, 2024
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EM CIMA DO MURO – MILITAR DA ATIVA X POLÍTICA – PARTIDÁRIA

Dentre as várias formas de pressão ao eleitor, com relação a posicionamento político-partidário, pode estar a conclamação a “sair de cima do muro”“da moita” ou “da caverna”, e a participar efetivamente de campanha de determinado candidato.

No tocante a eventual assédio ao eleitor militar, Pretendo aqui expor um pouco de minha convicção formada durante os mais de 25 anos de serviços prestados à sociedade Goiana e Tocantinense como policial militar. É claro que estou consciente de que estarei colocando “a júri” minhas palavras, que sem dúvidas despertarão a ira de alguns, a condescendência de outros e talvez o mais importante: a reflexão e o alívio dos que não tiveram a oportunidade se expressar.

Senhores Oficiais e Praças, somos sabedores de nossas obrigações como membros de uma Instituição séria, que sempre procurou se pautar pela legalidade em suas ações, e é assim que tem que ser!

Afirmo de pronto, categoricamente, que os oficiais e praças da Polícia Militar que se posicionam com neutralidade durante o embate das campanhas políticas, que permanecem à margem das militâncias partidárias, “não estão em cima de muro algum!”. Se posicionam desta forma em respeito aos preceitos legais que lhes impõem conduta isenta e é o que a sociedade espera deles.

Reza a Constituição Federal no § 3º do art. 142:

V – o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos;

Esta questão é tão seriamente tratada em nosso arcabouço legal, que pode ser causa de submissão a conselho com vista a averiguar a incapacidade do militar para permanecer em atividade, conforme estabelecido no decreto estadual 524/97.

“Art. 1º Os Conselhos de Justificação e de Disciplina são destinados a apurar a prática de infrações disciplinares e a incapacidade do Oficial, Aspirante a Oficial e demais Praças da Polícia Militar, com estabilidade assegurada, para permanecerem no serviço ativo,( …).   

(…)

Art. 2º Será submetido ao Conselho de Justificação todo Oficial e, ao de Disciplina, o Aspirante a Oficial e os demais Praças estáveis que incidirem nas infrações previstas no art. 8º deste Decreto.

(…)

Art. 8º Será submetido a Conselho de Justificação ou de Disciplina o Policial Militar que:

(…)

IX – filiar-se a partido político, fazer greve, sindicalizar-se ou exercer atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional (negritei”).

Atividades aparentemente simples e inofensivas como participar de carreatas, de distribuição de panfletos, de caminhadas, empunhar bandeiras, adesivar veículos com imagens de candidatos e siglas de partidos, na minha ótica são características de militância político-partidária que a Constituição Federal quis que algumas categorias de profissionais, dentre elas os militares se abstivessem, de outra feita não teria sentido lhes vedar expressamente a filiação.

Entendo que temos um relevante serviço a ser prestado ao povo tocantinense que se materializa na seriedade com que é realizado e, com relação às questões eleitorais, na imparcialidade que se espera do profissional militar do Estado.

De outra forma, que seria de nossa sociedade se os encarregados de fazer cumprir a lei mantendo a ordem e dando o suporte aos poderes constituídos para que subsistam, se embrenhassem no universo conturbado das forças de situação e de oposição político-partidárias?

Poderemos colocar em risco a própria democracia (lembrem-se de que estamos todos muito bem armados).

Se as paixões político-partidárias nos ocuparem visceralmente e influenciarem as nossas condutas, (e influenciarão) podem ter a certeza de que abandonaremos a conexão com nossos valores cuidadosamente cultuados pelos que vieram antes de nós e que são responsáveis pelo bom conceito que possuímos.

Somos sabedores dos estragos que causam à Corporação e à população, um simples apreço demonstrado por um graduado a qualquer político, no ambiente de atuação do menor destacamento da instituição, no menor povoado do Estado.

Que dizer então no caso dos oficiais que comandam a instituição e que são responsáveis pelas grandes frações distribuídas em todo território tocantinense, caso levantassem qualquer bandeira partidária? Será que nosso bom senso não nos permite vislumbrar o caos que isso pode causar?

Temos de ter em mente que a Corporação Militar (e a Corporação somos todos nós, oficiais e praças), só pode cumprir bem seu papel se agir com Isenção Total! Com Imparcialidade Total! Cumprindo suas obrigações legais.

Não podemos deixar então, que provocações de quem quer que seja nos induzam, ou que mirabolosas promessas de vantagens individuais nos estimulem, levando-nos a empunhar as bandeiras e cartazes das coligações político-partidárias, sob a estapafúrdia e desafiante afirmação de que temos que “descer do muro” ou“sairmos da moita” ou “sairmos da caverna”, para melhorarmos nossas condições de vida.

Regulamento de Ética Profissional dos Militares da Polícia Militar do Estado do Tocantins, Decreto estadual nº 696, de 11 de dezembro de 1.998 prescreve em seu art. 7º:

“Art. 7º. – Os deveres éticos, emanados dos valores militares e que conduzem a atividade profissional sob o signo da retidão moral, são os seguintes:

(…)

  • 5º. – São proibidas aos militares estaduais da ativa quaisquer manifestações individuais ou coletivas (…) de cunho político-partidário (…). (grifei).

  • 6º. – Observados os preceitos da ética militar e os valores militares em suas manifestações essenciais,é assegurado ao militarestadual inativo e aos agregados, para concorrerem a cargos eletivos, o direito da participação no meio civil, em atividades político-partidárias e em manifestações sobre quaisquer assuntos, excetuados os de natureza militar de caráter sigilosos”.

Notem que existe uma proibição explicitamente clara (§5º) em nosso regulamento de ética com respeito ao exercício das atividades político-partidárias ao militar da ativa, permitida somente aos que estão fora da atividade, ou seja: aos inativos e aos agregados para concorrerem a cargos eletivos (§ 6º).

Digo e repito: Não estamos em cima do muro! Estamos sob a égide da legislação vigente, que nos impõem uma ética profissional peculiar. Aliás, não somos os únicos que a sociedade através da lei mantém à margem do partidarismo político. OsMembros do Ministério Público e os Magistrados também, quando investidos de suas funções, têm que ser imparciais. Não podem e estão também proibidos pela Constituição e pelas leis de desenvolver qualquer atividade partidária.

Devemos nos lembrar, portanto, de nossos valores e nos apegarmos a eles, pois esta é a conduta que a sociedade espera de nós e é dessa forma que conquistamos o respeito que temos.

Assim, podemos citá-los, sem comentários excedentes, conforme disposto na Lei 125 de 31 de janeiro de 1990:

“Art. 26. São manifestações essenciais do valor policial militar:

  1. O sentimento de servir à comunidade tocantinense, traduzido pela vontade inabalável de cumprir o dever policial militar, e pelo integral devotamento à manutenção da ordem pública mesmo com risco da própria vida;
  2. O civismo e o culto da tradições históricas;
  3. A fé na elevada missão da Polícia Militar;
  4. O espírito de corpo, o orgulho  do policial militar pela organização onde serve;
  5. O amor à profissão policial militar e o entusiasmo com que é exercido;
  6. O aprimoramento técnico-profissional”.

Entendam que venho me referindo à atuação político-partidária por militar em atividade, e não quanto ao ser político, pois o homem, como já disse Sócrates, “é um animal político”. A esse respeito, muito bem escreveu o Dr. Régis Fernandes de Oliveira – Professor titular de Direito Financeiro da USP, advogado e desembargador aposentado do TJ/SP.

“(…) ser político é participar da sociedade e não ser omisso com as desigualdades sociais, com os graves problemas que afetam as comunidades, ser solidário com a fome, saber compreender os conflitos da comunidade, tentar pacificá-los, ajudar na busca de caminhos, apontar soluções. Ser político é ter a grandeza de saber que errou e recomeçar de novo. É não baixar a cabeça ao primeiro engano, mas reconsiderar e encontrar novas saídas. É ter humildade. É, em síntese, ser gente que sente como gente. É buscar sua dimensão humana e religiosa. É pecar por ação e não por omissão. É reconhecer-se um grão de areia, mas buscar ser uma estrela. É cumprir missões e inspirar-se no Criador para trabalhar à sua imagem. É escrever uma poesia sem ser poeta. É escrever um romance na vida, sem ser romancista. É jogar um jogo de futebol não sendo jogador. É participar da vida e sentir as emoções em todas as dimensões. É, diria simplesmente, sentir-se humano e estender a mão a outros seres humanos”.

Texto acessado em 19/09/2010. http://r2direito.uol.com.br/_site/artigos/artigo_default.asp?ID=27.

Esse jeito de viver, que é a essência do ser humano, a lei não nos toma, em nenhuma de suas exigências.

Conclamo, portanto, aos companheiros que ainda não se deixaram levar pelos ânimos da política partidária – aliás direito legítimo do cidadão que a lei permite e incentiva e que nos é vedado quando em atividade justamente para que os demais concidadãos possam exercê-los com a mais plena liberdade – enquanto no serviço ativo da Corporação não adotem essa conduta, nem para um lado nem para o outro.

Devemos sim, exercer nosso direito ao voto, se os deveres no dia das eleições o permitirem – pois a maioria estará prestando seus serviços em locais que podem não ensejar esse exercício – com a responsabilidade e a liberdade devida, elegendo representantes que possam trazer o melhor para nosso povo.

O militar que queira participar efetivamente das vertentes político-partidárias, que queira se eleger para contribuir com a sociedade de outra maneira, que o façam, no legítimo exercício das prerrogativas legais, afastando-se das atividades profissionais para esse importante mister. Todavia, aquele que estiver em suas funções normais, vestindo esta maravilhosa segunda pele que é a nossa farda, que tenha firme a decisão de se manter imparcial e cumpridor de suas obrigações.

Aos senhores políticos, que querem governar e legislar em nosso Estado – atribuições da mais alta magnitude no contexto de uma sociedade organizada – estejam cientes de que ao voltarem seus desejosos olhos para o valioso e sempre muito bem acompanhado voto do militar, tenham em mente que a discrição dele, que é uma prerrogativa de todo cidadão, é uma exigência de sua função pública, para que possa prestar um bom serviço.  Portanto, proteja-o, não o estimule a se manifestar e estará contribuindo para que ele não perca a sua autoridade.

Quem quer que convoque o militar a “sair de cima do muro”, ou qualquer outra desconfortante classificação pejorativa que se dê, está na verdade o empurrando contra ele, pois é como se sentirá ao lutar para manter sua neutralidade… literalmente prensado contra o muro!

Palmas 20 de setembro de 2010

 

Benedito Morais Ribeiro – Coronel PM

Subchefe do Estado Maior da Polícia Militar do Estado do Tocantins

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